Quando pensamos em férias os nossos pensamentos voam para lugares paradisíacos, à distância de muitas horas dentro de um avião. No entanto, aqui muito perto há um destino de férias cheio de boas razões para o visitar, a Madeira. A Madeira é especial, em pouco mais de 50km de comprimento e 22km de largura tem para oferecer gastronomia de alta qualidade, montanhas verdes cheias de escarpas, levadas e veredas que se perdem no meio dos montes, com um clima ameno ao longo de todo o ano que cativa quem quer que a visite.
Só conhece verdadeiramente a Madeira quem percorre as suas levadas e absorve as paisagens, sustém a respiração no cume dos montes e prova o que de melhor lá se faz, depois de dois dedos de conversa com um madeirense de sotaque cerrado. Só conhece verdadeiramente a Madeira quem visita os seus Miradouros no cimo de escarpas que se estendem sobre o mar, quem percorre a medo as estradas antigas (as que ainda são transitáveis) na orla das montanhas com o mar lá ao fundo, quem sente o pulsar dos dias nas ruas das aldeias menos turísticas. Só conhece a verdadeiramente a Madeira quem se deixa enamorar por esta pérola tão nossa.
Podia fazer uma lista interminável de razões para visitar a Madeira e ainda assim seriam sempre poucas, então achei melhor seleccionar apenas seis razões, mas que valem por muitas mais e de entre aquelas que me levam todos os anos à Madeira. A velha máxima de “nunca voltes ao lugar onde já foste feliz” para mim não faz qualquer sentido. Já fui muito feliz na Madeira, sou-o de cada vez que aterro naquela ilha e ainda assim continuo a regressar ano após ano.
A poncha
A poncha é a bebida mais típica da Madeira, quem vai à Madeira e não prova uma poncha é quase como não ir à Madeira. Apesar de ser uma bebida típica da zona de Câmara de Lobos, a poncha difundiu-se por toda a ilha e bebe-se durante o ano inteiro. A receita da poncha tem vindo a ser aperfeiçoada ao longo dos tempos mas a aguardente de cana de açúcar, o seu elemento fulcral, nunca poderá faltar. Têm-se até feito algumas variações com tangerina, maracujá e outros frutos mas a poncha tradicional (conhecida como “regional”) é a que mais se consome na ilha. Claro que a juntar à aguardente e ao sumo de laranja temos o mel, para compor um bom copo de poncha, tudo bem mexido com o tradicional pau-de-poncha.
Não posso deixar de recomendar dois dos meus sítios de eleição para beber a poncha na ilha, o primeiro é a Taberna da Poncha na Serra d’Água, no concelho da Ribeira Brava, um lugar pitoresco, com uma decoração muito peculiar, onde é socialmente aceite (e obrigatório até) mandar as cascas dos amendoins que acompanham a poncha, para o chão. A Taberna da Poncha é “o ponto de encontro”. Ao domingo à tarde ou mesmo ao fim do dia antes de regressar a casa, combina-se uma poncha na Taberna da Poncha. É entrar porta a dentro e pedir “uma ponchinha, se faz favor”.
Outro lugar que me foi apresentado por quem lá vive e que me deixou imediatamente rendida à poncha de tangerina é a Venda do André, que fica em Câmara de Lobos. À porta, um burro de barro dá-nos as boas vindas e mal entramos na Venda sentimo-nos recuar aos anos 70 numa época de mercearias e tabernas, um negócio que fazia sentido em conjunto. Sempre que lá entro sinto-me voltar a uma época em que ir à loja (mercearia) era um roteiro comum em qualquer aldeia. A Venda do André é assim original e antiga ao mesmo tempo, num cruzar dos tempos que nos permite apreciar a poncha de um modo mais genuíno.
As Levadas
As Levadas são canais usados para a irrigação da ilha, para transportar a água dos locais em que mais se acumula nomeadamente das vertentes a norte para outros onde chove menos, especificamente o sul. Começaram a ser construídos ainda no séculos XVI mas foram sofrendo reconstruções ao longo dos tempos e as mais recentes datam da década de 40 do século passado. No total perfazem cerca de 1400km e é possível percorrê-las a pé conhecendo assim paisagens da ilha que de outra forma não seria possível. Estas Levadas fazem-se acompanhar em todo o seu percurso por trilhos com graus de dificuldade vários que convidam quem visita a Madeira a desfrutar de uma paisagem incrível.
A natureza acidentada do terreno da ilha é bem visível a partir destes trilhos. A maioria deles é viável a qualquer idade e condição física, no entanto, existem-nos mais perigosos e alguns estão mesmo encerrados dado o grau de perigo que representam. É conveniente fazer-se acompanhar por alguém que conheça o percurso, levando sempre roupa e calçado adequados, lanterna, água e um farnel. No cimo dos montes pode fazer mesmo muito frio, é muito húmido e os caminhos com pedra estão muitas vezes cheios de musgo. Ainda assim, a paisagem de cortar a respiração, a tranquilidade dos montes e a paz de espírito que ali se faz sentir fazem valer a pena a caminhada e o esforço físico que temos de despender.
Das várias Levadas que já fiz na Madeira fiquei claramente fã da primeira: a Levada do Caldeirão Verde. O percurso tem 6.5km (não é circular, pelo que é preciso voltar para trás, o que perfaz um total de 13km), pode durar cerca de 6 horas, tem início (e fim) no Parque Florestal das Queimadas, no Concelho de Santana, numa altitude de 990 metros, exige uma preparação física moderada, é conveniente levar um farnel, água, lanterna e um casaco quente e impermeável. É ainda aconselhável ir acompanhado de alguém que conheça o caminho, por uma questão de segurança.
Esta Levada data do século XVIII, tem início no leito principal da Ribeira do Caldeirão Verde e atravessa montanhas e escarpas transportando água para os terrenos agrícolas da freguesia do Faial. Neste percurso podemos observar inúmeras espécies pertencentes à Floresta Laurissilva.
A Levada culmina no lago do Caldeirão Verde formado por água que cai do leito do Ribeiro do Caldeirão Verde a 100 metros de altura em forma de cascata com uma paisagem envolvente esplêndida onde devemos repousar e apreciar a natureza.
Cabo Girão
No lado sul da ilha, na zona de Câmara de Lobos, a cerca de 20 minutos de carro do Funchal, encontra-se uma das mais altas falésias do mundo, a uns imponentes 580 metros do nível do mar, conhecido pelo Cabo Girão.
Há alguns anos foi aqui construída uma plataforma suspensa em vidro que assusta quem tenha vertigens. É um local privilegiado para parapente e base-jumping e foi aqui que Mário Pardo fez um fabuloso salto de mota.
A magnífica falésia é agora um dos pontos turísticos mais visitados na ilha e permite a quem lá passa apreciar a vista sobre Câmara de Lobos e sobre a baía do Funchal.
Espetada madeirense
Em qualquer região portuguesa a gastronomia atinge píncaros de qualidade muito apreciada por quem nos visita e por quem cá mora e a Madeira não é excepção. A Madeira tem óptimos pratos de marisco e peixe fresco: lapas, bife de atum ou até filetes de espada, no entanto, nada bate a famosa espetada madeirense, feita de carne de vaca de grande qualidade, em espeto de pau de louro (em alguns lugares apenas), precedida de bolo do caco e acompanhada por milho frito.
A carne é suculenta e saborosa, tem uma textura perfeita, mesmo para os menos apreciadores de carne de vaca, o sabor é divino e apetece comer até não caber no estômago nem mais um pedacinho daquela iguaria única. Quando vem para a mesa, a espetada ainda a pingar e quente que dói, uma pessoa fecha os olhos e delicia-se com o repasto, a acompanhar uma boa conversa entre amigos. Um sítio excelente para comer a espetada é no Viola, no Estreito da Câmara de Lobos, lugar que frequento ano após ano.
Ponta de São Lourenço
Na ponta leste da ilha encontramos a Ponta de São Lourenço, um conjunto de imponentes escarpas que são constantemente esbofeteadas pelo mar que se transforma numa espuma branca de acalmia. A sensação que tenho quando chego a este lugar é que a mão do homem nunca ali passou, é tudo tão puro, tão genuíno e tão natural.
A vista sobre os dois lados da ilha e sobre as formações de rocha vulcânica é única, tornando a paisagem em algo completamente diferente do resto da ilha. Quando as condições meteorológicas o permitem é possível avistar facilmente a ilha do Porto Santo a partir deste ponto.
O clima nesta zona é semiárido e a presença dos ventos do Norte fazem com que a vegetação existente seja rasteira e não existam árvores, contrastando com a paisagem do resto da ilha. É no Ilhéu do Desembarcadouro, que se avista ali tão perto, que existe uma das maiores colónias de gaivotas da região.
Logo abaixo, no seguimento da estrada, podemos encontrar uma das mais caricatas praias da Madeira: a Prainha. Esta é a única praia de areia preta natural na ilha, isolada e resguardada das grandes multidões.
Baixa do Funchal
A Baixa do Funchal está, de certa forma, de cara lavada. Nas ruelas mais estreitas, onde tantos madeirenses, continentais e estrangeiros se reúnem nas noites de fim de semana para copos e conversa vêem-se pinturas coloridas em portas de edifícios há muito desabitados. É nestas ruelas que nascem restaurantes de qualidade com gastronomia típica, e onde as esplanadas se estendem até à estrada. As floristas esperam por alguém que lhes compre flores de todas as cores e o Mercado dos Lavradores, ímpar na sua oferta de frutas exóticas, dá gosto apreciar. Por aquelas ruas da baixa do Funchal, agora tão cheias de vida, de sorrisos, boa disposição, transparece a ânsia de viver e de mostrar o quão bem se está na Madeira.
As razões para visitar a Madeira não acabam aqui, há muito mais naquele arquipélago para ver, para provar e para sentir.
Uma pérola no Atlântico. Precisam de mais razões ou estão convencidos a viajar para a Madeira nas próximas férias?